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Mesmo não sendo entusiasta do princípio da insignificância, em alguns casos ela se mostra evidente.

Posted by Chrystiano Angelo On quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015 0 comentários



Mesmo não sendo entusiasta do princípio da insignificância, em alguns casos ela se mostra evidente.


Acabei de analisar caso de prisão em flagrante de um furto de um desodorante de R$ 10,68 de um supermercado, praticado por um sujeito que nunca foi preso ou processado antes.
Anulei o flagrante e o coloquei em liberdade.
Eis o caso:
Vistos etc.
Trata-se de comunicação da prisão em flagrante de MLRA por prática de delito de furto simples, em que, autuado, recebeu a Nota de Culpa, comunicando-se a Defensoria Pública.
A autoridade policial arbitrou fiança, que não foi recolhida, alegando o preso falta de condições financeiras para isso. 
Interveio o Ministério Público, pugnando pela homologação do flagrante e liberdade imposição de medidas cautelares, diversas da pecuniária.
Relatados.
Formalmente legal a prisão, não se observando, de plano, qualquer irregularidade ou nulidade, existindo indícios suficientes nos autos da prática da conduta pelo autuado.
Entretanto, é certo que a lei penal não deve ser invocada para atuar em hipóteses desprovidas de significação social, razão pela qual os princípios da insignificância e da intervenção mínima surgem para evitar situações dessa natureza, atuando como instrumentos de interpretação restrita do tipo penal.
Ocorre que, aceita a idéia de forma irrestrita, o Estado estaria dando margem a situações de perigo, na medida em que qualquer cidadão poderia se valer de tal princípio para justificar a prática de pequenos delitos, incentivando-se, por certo, condutas que atentariam contra a ordem social.
Conveniente trazer à colação excerto do voto proferido pelo E. Ministro Celso de Mello, no HC 98.152/MG, que apresenta os requisitos necessários para a aferição do relevo material da tipicidade penal, verbis:
O postulado da insignificância que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público em matéria penal.
No caso, trata-se de furto de objetos em Supermercado de médio porte que foram avaliados pela vítima em R$ 10,68 (dez reais e sessenta e oito centavos), situação que claramente mostra a presença de tais vetores, especialmente quando pesquisa no SAJ, BNMP e site do Tribunal de Justiça da Paraíba, local de origem do autuado, resultam na constatação da inexistência de antecedentes criminais, ou mesmo que responda ou tenha respondido a qualquer ação penal.
É o caso, portanto, de reconhecer-se a insignificância da conduta e ter por ilegal sua prisão. 
Neste sentido:
PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. IMPROPRIEDADE. FURTO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. FLAGRANTE ILEGALIDADE. EXISTÊNCIA. IMPETRAÇÃO NÃO CONHECIDA. CONCEDIDA A ORDEM EX OFFICIO.
1.(...).
2. Consoante entendimento jurisprudencial, o "princípio da insignificância - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentaridade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material.
(...) Tal postulado - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público" (HC n.º 84.412- 0/SP, STF, Min. Celso de Mello, DJU 19.11.2004).
3.No caso, o paciente subtraiu um saco de cimento, uma pá e uma enxada avaliados em R$ 65,00 (pouco mais de 10% do salário mínimo então vigente), tendo sido as coisas devolvidas à vítima, que não experimentou nenhum prejuízo material. Além do que o paciente não ostenta qualquer condenação por crime contra o patrimônio.
4. Reconhece-se, então, o caráter bagatelar do comportamento imputado, não havendo falar em afetação do bem jurídico patrimônio.
5. Flagrante ilegalidade detectada.
6. Impetração não conhecida, mas concedida a ordem, ex officio, para, reconhecendo a atipicidade material da conduta, trancar a ação penal.
(HC 274.921/MG, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 14/10/2014, DJe 29/10/2014)
Isto posto, reconheço a insignificância da conduta imputada e tenho inexistente situação de flagrante, deixando de homologar a prisão e concedendo habeas corpus de ofício ao autuado, mandando expedir-se alvará de soltura em seu favor, se por al não dever continuar preso.
P. R. I., inclusive o Ministério Público. Redistribua-se após o plantão judiciário.
Natal, 18 de fevereiro de 2015
Henrique Baltazar Vilar dos Santos
Juiz de Direito plantonista


Fonte: https://www.facebook.com/henriquebaltazar.vilarsantos/posts/715583205226617?fref=nf&pnref=story

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