Tiro
ao MP
A
aproximação da apreciação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) número 37
trouxe novamente o assunto à tona. A PEC já tramitou pelas comissões da Câmara
dos Deputados e está sujeita à votação em plenário. O tema suscita discórdia.
Ontem, um representante nacional da classe dos delegados mostrou o seu
posicionamento quanto ao que chama de “PEC da Legalidade”.
A
PEC tem entendimento distinto entre delegados e promotores. Magnus Barreto é
delegado da Polícia Civil potiguar há mais de 30 anos. Ele ocupa atualmente o
cargo de diretor da Associação Nacional dos Delegados de Polícia e demonstrou
ontem ao NOVO JORNAL como vê a proposta que concede a exclusividade de
investigação criminal às polícias judiciárias. Uma consequência direta de uma
eventual aprovação da proposta é o afastamento do Ministério Público de tais
apura
Da
pasta que está sobre a mesa na sala da presidência do Conselho Estadual de
Entorpecentes – cargo que Barreto também ocupa –, o delegado retira envelopes
brancos. Os papeis lá contidos são espalhados e, enquanto a entrevista ocorre,
ele procura, puxa e cita alguns documentos. Sobre a mesa, estão posicionamentos
oficiais da Associação reiterando a necessidade da aprovação da PEC e tentando
desfazer os argumentos apresentados pelo Ministério Público.
Para
embasar a sua visão, Barreto cita por duas vezes juristas nacionais. Para
argumentar, também faz uso de reportagens. A tese do delegado de que a PEC 37
deve ser aprovada se sustenta em dois pilares: o que a Constituição já prevê e
a suposta incapacidade dos promotores em investigar.
Para
o primeiro ponto, argumenta: “Nenhum dos itens constitucionais preveem a
investigação feita pelo Ministério Público. MP pode pedir a instauração do
inquérito, pode pedir diligências, pode e deve fazer. Mas o Ministério Público
não deve investigar porque ele é parte no processo. Se ele é parte no processo,
ele desequilibra”.
O
delegado é incisivo ao expor a opinião de que promotores de Justiça não possuem
a capacidade de realizar investigações. “O Ministério Público vem fazendo
reiteradas vezes algumas investigações. Gostaria que você procurasse saber
quantos presos do sistema carcerário estão lá em razão de investigações do MP.
É muito próximo de zero, eu posso lhe garantir. E por que isso? Porque eles
simplesmente não sabem investigar”, declarou sem rodeios o representante da
categoria dos delegados.
As
críticas não param por aí. Magnus Barreto descreve como “investigações pinçadas
em busca de mídia”. Para ele, o MP escolhe os casos que quer apurar e, para
isso, usa como fator a repercussão midiática. “Eles dizem que as polícias civil
e federal não têm capacidade para realizar todas as investigações. E eles têm?
Eles vão fazer todas as investigações ou só querem pinçar aquelas que dão
mídia? Eles querem aquelas midiáticas. Eles não vão nunca investigar o furto de
uma bicicleta lá na Zona Norte. Uma bicicleta às vezes pode representar muito
mais do que um automóvel para outro. Mas isso ele não vai fazer”, disse.
Ele
continua sugerindo que ocorre uma busca por mídia por parte dos promotores.
“Agora, se der mídia, se for alguma coisa contra um ex-governador, um ex-deputado,
ex-prefeito, um grande empresário, aí pelo fato de dar mídia eles querem vender
isso aí”, reiterou.
Após
argumentação a favor da PEC 37, ele continua disparando contra o MP. “Nunca
pensei que tivesse tanta gente despreparada no Ministério Público. O pior é que
esse povo se arvora de um saber jurídico diferenciado. Eu sou delegado da época
do primeiro concurso aqui e tiveram alguns promotores que fizeram concurso
comigo na época. E minha nota foi muito melhor que as deles todos. Meu saber
jurídico não troco pelo deles. Os caras se arvoram sabedores e na hora de uma
discussão a gente percebe que eles só estudaram para a prova”, atacou.
Para
delegado, falta de estrutura atrapalha Polícia Civil do RN
Questionado
sobre como enxerga a Polícia Civil potiguar, o delegado Magnus Barreto tem uma
resposta pronta e contra a qual é difícil encontrar motivos para
questionamentos. “A estrutura da Polícia Civil é muito frágil. O MP que é o
fiscal da lei, que poderia exatamente, ao invés de estar batendo com isso, deveria
estar cobrando estrutura para a Polícia, para que a Polícia pudesse atender
melhor à população. Se você for hoje, você vê a fragilidade. Mas saia e vá lá
no MP para você ver a riqueza. Parece até outro país”, comparou.
Barreto
sugeriu que o MP deveria ser mais incisivo na busca de melhorias para a Polícia
e que isso teria relação direta com os índices de violência. “Se o MP, ao invés
de estar fazendo advocacia própria, puxando a brasa para sardinha deles,
estivesse lutando pela Polícia, possivelmente os índices de criminalidade
seriam muito mais baixos”, acrescentou.
Ele
admitiu que a deficiência da Polícia resulta em lacunas de investigação, mas
voltou a sustentar que o MP tem papel decisivo para que isso seja contornado.
“É claro que há lacunas. Você imagine uma delegacia de polícia que não tem a
quantidade de agentes, que não é suficiente, não tem carro descaracterizado,
como é que isso pode funcionar a contento? O MP deveria estar em cima
fiscalizando para que a Polícia pudesse ter a estruturação necessária. O que se
quer é que a gente atue em conjunto A Polícia não quer atuar sozinha”, disse.
Questionado
sobre a ausência de autonomia dos delegados, Barreto também contornou. Para
ele, o fato de hoje os delegados serem suscetíveis a transferências injustificadas,
a qualquer momento, atrapalha. A categoria aguarda a tramitação de uma proposta
no Congresso Nacional que altera essa situação. “Existe uma PL [Projeto de Lei]
que será votada em caráter terminativo no Senado que irá sanar esse problema.
Se você tira alguém que está à frente de um inquérito policial e sem razão
nenhuma, sem fundamentação…”, afirmou em tom misterioso, sem finalizar a
sentença.
Natal
recebeu força tarefa pela PEC 37
Assim
como a Associação Nacional dos Delegados tem buscado o convencimento para a
aprovação da PEC 37, a categoria de promotores e procuradores-gerais de Justiça
tem peregrinado em busca de apoio para derrubar a proposta. Exemplo disso foi o
encontro de procuradores de todo o Brasil sediado em Natal na semana passada. Os
membros do MP montaram o encontro como estratégia para reforçar o
posicionamento da categoria quanto ao assunto. “Nós não queremos não ter
limites. Nós queremos sim, ter a capacidade de investigar, não para substituir
a polícia. Mas aonde a polícia não chegar, pela natureza da instituição ou pela
natureza de quem praticou o crime, nós podemos ir”, ressaltou o representante
amazonense do MP, Francisco das Chagas Santiago Cruz, em entrevista ao NOVO
JORNAL na semana passada.
Batalha
de apelidos
Para
quem não está acompanhando o assunto, pode até soar estranho. Mas, quando
promotores falam sobre a “PEC da Impunidade” e delegados falam de “PEC da
Legalidade” ou “PEC da Cidadania” estão se referindo à mesma proposta de emenda
à Constituição. É uma batalha de apelidos que denotam o posicionamento
completamente oposto entre as duas categorias.
Na visão do MP, a proposta irá gerar impunidade em razão da fragilidade das estruturas da Polícia Civil em todo o país. Assim como, diversas operações foram deflagradas pela instituição buscando combater a corrupção.
Na visão do MP, a proposta irá gerar impunidade em razão da fragilidade das estruturas da Polícia Civil em todo o país. Assim como, diversas operações foram deflagradas pela instituição buscando combater a corrupção.
Do
lado dos delegados, a PEC ratifica o que a Constituição já prevê: a
exclusividade de investigações por parte das polícias judiciárias. “Essa é a
PEC da legalidade. A Constituição prega exatamente o que a PEC está
fortalecendo. Ela só está tornando o óbvio mais óbvio”, insiste o delegado
Magnus Barreto.

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