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Entrevista do Promotor de justiça de Mossoró Dr. Ítalo Moreira Martins

Posted by Chrystiano Angelo On domingo, 1 de maio de 2011 0 comentários
É de se observar pela entrevista do nosso Ilustríssimo Representante do Ministério Público de Mossoró, Dr. Ítalo Moreira Martins, a dificuldade e complexidade do assunto abordado  nessa entrevista concedida ao Jornal de Fato de Mossoró.
Todavia, postei apenas parte da entrevista.
NA OPINIÃO do senhor, que tem acompanhado de perto os processos criminais há vários anos em Mossoró, por que estão matando tanta gente em Mossoró?
SÃO muitos fatores, quase sempre são apontados problemas relacionados às drogas, e eu acredito sim que seja um fator preponderante, mas acho que falta um maior e melhor trabalho de investigação. Mas onde está a estrutura para isso? A Polícia não tem. Acho muito cômodo, ao surgir uma execução, simplesmente se passar a versão oficial que tem relação com o tráfico. Isso acontece não apenas em Mossoró, mas também em Natal, e, em geral, nas médias e grandes cidades brasileiras. Mas há outros fatores, alguns crimes são passionais, outros por vingança, "queima de arquivo", etc. Mas realmente acredito que a maior parte do número de homicídios esteja, sim, relacionada ao tráfico, aliás, não apenas homicídios, mas furtos e roubos também, cuja incidência é elevada em Mossoró.
NA SUA avaliação, qual o perfil dessas pessoas que estão sendo executadas?PELO que observo, em sua maioria, são pessoas de baixa renda, moradores da periferia, a quem se atribui, ainda que informalmente, algum tipo de envolvimento com delitos.
O SENHOR concorda com a opinião do delegado Renato Batista de que o crescimento do número de homicídios coincide com a chegada do crack a Mossoró?NÃO só em Mossoró, mas aonde a droga chega, principalmente o crack, há aumento da criminalidade. Mas, cabe ao Poder Público o papel de procurar tratar e livrar do vício os consumidores, pois estes poderão ser os homicidas e assaltantes de amanhã, e também as vítimas dos homicídios por dívidas com traficante. É uma questão de saúde pública. E esse papel é mais abrangente, envolve Município, Estado e União. E onde estão as clínicas de recuperação? O que é feito para tirar essas pessoas do vício? Há muitos que querem sair do vício e não conseguem, aí caberia ao poder público agir, mas este é omisso e não proporciona, em regra, o tratamento. Só os mais ricos normalmente têm acesso a esses tratamentos, pois arcam com as despesas.
O QUE está havendo que os policiais não conseguem prender quem financia o tráfico e somente transportadores e pequenos traficantes?MINHA atuação criminal não é relacionada diretamente ao tráfico, mas não fugirei da pergunta. Esse é um problema crônico nacional, tirando raras exceções, só são presos pequenos traficantes. O mercado da droga gera quantias fabulosas em dinheiro, portanto é impossível imaginar que os grandes traficantes morem em favelas, local de moradia de quase todos os que são presos. No próprio exemplo do Rio de Janeiro, os grandes traficantes mesmos não estão nos morros; estão em condomínios de luxo da zona sul carioca. Guardadas as devidas proporções, o mesmo deve ocorrer no Rio Grande do Norte e em Mossoró. Os financiadores, como mencionado na pergunta, que na realidade são traficantes, freqüentam festas sociais, fazem parte, geralmente, do "círculo do poder", são bem relacionados e influentes e colocam seus "tentáculos" nas diversas instituições públicas, quando não fazem parte delas próprias. Para alcançar esses financiadores aí vem a mesma questão, falta inicialmente estrutura de trabalho e de inteligência para a Polícia, pois com a disponível só dá para pegar, e mal, pequeno traficante, já que os grandes, por atuarem de forma mais organizada, complexa e menos ostensiva, nunca aparecem, pois comandam tudo à distância. Além disso, e há de se colocar aqui o "dedo na ferida", falta sim uma vontade política para se investigar os financiadores do tráfico (os grandes traficantes), digo isso mais relacionado às cúpulas das seguranças públicas dos Estados, que poderiam colocar esse combate ao crime organizado, aos verdadeiros chefes do tráfico, como prioridade. Enquanto não se combater o grande traficante, aquele que aparece como "bom moço", que freqüenta as festas sociais, faz parte do "círculo do poder" e tira fotos para colunas sociais, o tráfico continuará crescendo. O pequeno traficante que é preso, logo é substituído por outro "soldado" do tráfico, e essas substituições são rápidas. Ou se consegue chegar aos "generais" do tráfico ou essa situação dificilmente muda. Só que estes últimos agem livremente, contando com seus prestígios para preservar suas "patentes" e perpetuar a impunidade.

O QUE pode ser feito em longo prazo para melhorar a segurança publica, observando a precariedade da educação e também do sistema prisional?
MUITOS acham que é fácil resolver a questão, e não é. São vários fatores, cada um com seu grau de influência. Tudo deve ser pensado e analisado de forma ampla, racional e com inteligência, sem sensacionalismo e palavras de mero efeito retórico. Quanto à educação, é indiscutível que sua precariedade influencia o crime. Mas, não falo apenas em facilitar o acesso das pessoas à sala de aula, porque senão haveria uma enorme contradição difícil de explicar, pois cada vez mais o brasileiro tem acesso à escola, cada vez mais brasileiros conseguem terminar um curso superior, no entanto a criminalidade só cresce. Deve ser discutido que tipo de educação vem sendo dado, quais os valores estão sendo ensinados e, sobretudo, qual o papel da família nessa escalada da criminalidade. Na minha ótica, a principal educação é aquela dada pelos pais. E esses, muitas vezes, são omissos. São impostos limites aos filhos? Pode parecer mero discurso filosófico, mas não é. Os jovens cada vez entram mais cedo no mundo do crime, e os pais, o que fazem? No que se refere ao sistema prisional, observa-se que este mais contribui para o aumento da criminalidade do que ajuda a reduzir. Nossas prisões são "fábricas de criminosos". Não acredito muito no discurso de que o sistema prisional deve ressocializar, não que esse não seja também seu objetivo; é. Mas, acho que a verdadeira ressocialização, quando possível, começa quando o detento deixa o sistema prisional. É no convívio em sociedade que ele poderá se ressocializar. Penso que se o sistema prisional deve fornecer as mínimas condições de dignidade ao preso, não o transformando num "monstro social". Se conseguirmos não piorar o detento, já teremos avançado muito. E, por mais que a sociedade por vezes não queira tratamento mais digno para presos, nós temos que pensar o seguinte: um dia, mais cedo ou mais tarde, ele vai sair da prisão, um dia voltará ao convívio social, e não é nada interessante que ele volte pior, mais nocivo e mais perigoso. Isso deve merecer a reflexão de todos.
Fonte: http://www.defato.com/entrevista1.php

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