ABUSO DE AUTORIDADE: MEDO
Antes
de iniciarmos o tema, devemos entender primeiramente o significado da palavra
medo, pois bem; medo é “Estado emocional
provocado pela consciência que se tem diante do perigo; aquilo que provoca essa
fonte imagem: https://www.institutomillenium.org.br/
consciência”[1] ou
seja, é um verdadeiro sentimento a um entendimento precoce ou real a algum tipo
de ameaça ou temor de algo ruim que está por supostamente por vir.
Em todo o Brasil, está se discutindo e
questionando a nova lei com conceitos positivos e negativos, urgindo assim, um
verdadeiro debate nacional, no entanto, em meios aos debates, está surgindo
também, discursos confusos e inseguros, principalmente pelas autoridades que são
submissas a lei diretamente.
Na verdade, a “Lei de Abuso de Autoridade” não é
novidade no Brasil. No ano de 1965, foi regida pela Lei 4.898[2]
que tratava do mesmo tema, apesar de que, na aplicabilidade dessa lei, durante
54 anos, foi considerada pela nossa sociedade, como uma lei solta, branda,
vazia, não punitiva e não taxativa, além disso era tão somente destinada ao
Poder Executivo.
A nova Lei de Abuso de Autoridade, falo da Lei 13.869 de 05 de setembro de 2019[3],
expandiu o texto da lei anterior, abarcando os poderes: Legislativo, Executivo,
Judiciário e inclusive o Ministério Público ou seja: atinge diretamente todos
os agentes públicos do Brasil e que de fato estão incomodados com
aplicabilidade e eficácia da lei, ou seja: estão com “medo” de serem punidos.
Iniciando-se já em uma pequena análise, percebe
claramente que a Lei 13.869 de 2019 evoluiu significativamente em relação a Lei
4.898 de 1965, possuindo um corpo mais taxativo e punitivo.
Na verdade, percebemos que alguns critérios da
nova lei, já estavam presentes na nossa
Constituição Federal de 1988, e que costumeiramente, os servidores públicos de
modo geral não a respeitavam, inclusive ultrapassando e até mesmo exacerbando
as suas responsabilidades e limites, precisando nesse sentido, serem obrigados
a moldar essa nova lei por imposição de uma sanção penal e administrativa.
Podemos citar exemplos simples e rotineiros de
violações de direitos pelos próprios servidores públicos em todo o Brasil, e
que inclusive atos como esses, são considerados ainda, normais e aceitos até
mesmo pela própria sociedade.
Pois
bem: quem nunca se deparou com fotos ou vídeos de suspeitos presos decorrentes
de ilícitos penais, que foram exibidos como meros troféus por meios dos veículos
de comunicação, redes sociais, e pelos aplicativos de celulares?
Existem centenas de milhares registros
fotográficos circulando por todo Brasil nessa condição, podemos aqui, citar
01(um) exemplo que ficou conhecido nacionalmente, onde dois delegados de
polícia civil, após uma operação policial que resultou em 11(onze) suspeitos
mortos, divulgaram fotos e vídeos e inclusive (dos corpos e do local do fato).
Não obstante, os dois delegados de polícia civil
ainda fizeram seus próprios registros fotográficos fazendo pouse ao meio dos
corpos mutuados que divulgaram com muita satisfação para todo o Brasil.
Além desse exibicionismo desnecessário, grande
maioria dos mortos aparece nas imagens apenas de cueca, como uma intenção de
promover uma ridicularização social e além disso, ao produzirem esse cenário
fotográfico, dificultaram a parte processual da perícia do ITEP e o trabalho do
próprio Ministério Público no momento que mexeram na cena do crime.
“fotos que circulam pelo aplicativo de mensagem Whatsapp
mostram os corpos amontoados dentro da casa e, posteriormente, na caçamba da
caminhonete apreendidas no local. Grande parte do grupo aparece nas imagens
apenas de cueca.”[4]
Pois bem, com o entendimento
do art. 13 da Lei 13.869 de 2019 a autoridade coautora que submeter o suspeito
em situação vexatória, fazer registro fotográfico de seu rosto ou corpo, exibir
no mundo virtual para o conhecimento público será responsabilizado a uma pena
de detenção de 1 (um) a 4
(quatro) anos, e multa, sem prejuízo da pena cominada à violência.
Vejamos:
Art. 13. Constranger o preso ou o detento, mediante
violência, grave ameaça ou redução de sua capacidade de resistência, a:
I - exibir-se ou ter seu corpo ou parte dele exibido à
curiosidade pública;
II - submeter-se a situação vexatória ou a
constrangimento não autorizado em lei;
Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa,
sem prejuízo da pena cominada à violência.
Como
já dissemos, esse tipo de violação é rotineiro em todo Brasil, considerado
normal até mesmo para a nossa sociedade, mesmo sem entenderem que todos estão
ensejando na violação do Princípio da Inviolabilidade a Privacidade
cristalizada no art. 5º, inciso X, da nossa
Constituição Federal de 1988[5]
Art. 5º Todos
são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
X -
são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de
sua violação;
Observem que, além da
existência da Lei 4.898 de 1965, já
estava previsto na nossa Carta Magna que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a
imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material
ou moral decorrente de sua violação.
Todavia, precisou por meio da nova lei, taxar sob pena,
o que as autoridades deveriam por força de lei está cumprindo, afinal, é isso o que determina a
nossa clausula pétrea, até porque os danos previstos e sofridos, extrapolam dos
danos materiais e morais e que infelizmente deixam rastros irreparáveis, são
sequelas que não atingem tão somente os suspeitos e sim o objetivo é também
atingir toda a sua família.
Nesse cenário, surge
verdadeiras criticas por parte das autoridades policiais e inclusive pela
própria imprensa que entendem se sentirem prejudicas na proibição das tais
fotos, fortalecendo assim, o “MEDO” de responderem criminalmente diante da Lei
de Abuso de Autoridade.
Em relação a nossa imprensa,
em momento algum vai ocorrer qualquer impedimento ao direito de informação
ou sequer, vai diretamente, atingir a
liberdade de imprensa, pois não se pode também, vender matérias jornalísticas
por meio de violação das leis inclusive da Constituição Federal de 1988, pois
sem dúvidas o objetivo da Lei de Abuso de Autoridade é impedir que os abusos e
transgressões sejam praticadas por servidores públicos.
Diante desse medo real de
punição prevista na nova
Lei de Abuso de Autoridade “13.898 de 2019” às autoridades coautoras de todo o
Brasil, estão recebendo orientações de seus respectivos estados, para que,
tanto a Polícia Militar ou Civil não divulgarem mais nomes e nem fotos de suspeitos
presos para evitarem o enquadramento da nova Lei.
Podemos
citar a Polícia Militar e a Polícia Civil do Distrito Federal, que mudaram os procedimentos
justamente para evitar o enquadramento na lei, ou seja: as corporações não
divulgam mais nomes nem fotos de suspeitos presos durante operações e nem mesmo
divulgar as fotos borradas.[6]
Outro
exemplo é o Governo do Estado do Rio Grande do Norte, que também está se
adequando a nova Lei, onde os gestores públicos, estão recomendando para os
seus servidores, que não divulguem mais os nomes e fotos de suspeitos presos.[7]
O
objetivo dos governantes, é fazer com que, nenhum policial responda diante da
nova lei.
É
de se estranhar que até mesmo os próprios magistrados assumem diretamente a
possibilidade de violarem a Lei de Abuso de Autoridade e criticam veementemente
a aplicabilidade da nova lei.
As
autoridades do nosso judiciário, o Ministério Público ou as autoridades
coautoras, não devem criticar e sim, devem acatar, pois só está existindo
críticas pelo MEDO DE SEREM PUNIDOS DIANTE DA LEI, o que não deveria existir,
até porque são servidores públicos e fiscais da lei.
É
um absurdo um magistrado afirmar que a norma incrimina atividade de julgar[8],
independentemente do artigo apresentado na Lei de Abuso de Autoridade, até
porque a nossa Constituição Federal de 1988 retrata com grande clamor, o
Princípio da Isonomia que é de fato, um dos direitos fundamentais de cada
brasileiro, que tanto lutou e luta pela igualdade dentro do Estado Democrático
de Direito e assim Reza o
artigo 5º, caput, da Constituição Federal
vigente que:
"todos
são iguais perante a Lei sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes(...)". Depreende-se do mencionado dispositivo
constitucional que é assegurada a igualdade a todos os cidadãos, sem distinção
alguma. [9]
No
entanto, o que todos esquecem e vem desrespeitando é que antes mesmo da Lei
13.898 de 2019 ser taxativo com o tema, a própria Constituição Federativa do
Brasil de 1988 já conceituava em seus artigo Art. 5º inciso X,
além também que o direito de imagem já é vislumbrado nos Tratados Internacionais
de Direitos Humanos e inclusive na Lei
de Execução Penal em seu artigo 41 além do artigo 20 do Código Civil.
Vejamos:
“salvo
se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da
ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a
publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser
proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe
atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins
comerciais” – e a Lei de Execução Penal, artigo 41, inciso VIII –
“constituem direitos do preso: proteção contra qualquer forma de
sensacionalismo”.[10]
Ou seja: o que está na lei já
vem ou tem respaldado na Constituição, tratados e leis infraconstitucionais
então pergunto: Por que os magistrados, autoridades coautoras e servidores
públicos estão com MEDO?
Será que o objetivo são as
autoridades transgredirem as leis? Ou o objetivo, responsabilidade, dever e
obrigação é de cumprir e fazer valer o Estado Democrático de Direito?
Em um pequeno resumo da lei
de abuso de autoridade
Veja
os artigos da lei de abuso de autoridade
Crimes
punidos com detenção de seis meses a 2 anos
- Não
comunicar prisão em flagrante ou temporária ao juiz
- Não comunicar prisão à família do preso
- Não entregar ao preso, em 24 horas, a nota
de culpa (documento contendo o motivo da prisão, quem a efetuou e testemunhas)
- Prolongar prisão sem motivo, não executando
o alvará de soltura ou desrespeitando o prazo legal
- Não se identificar como policial durante uma
captura
- Não se identificar como policial durante um
interrogatório
- Interrogar à noite (exceções: flagrante ou
consentimento)
- Impedir encontro do preso com seu advogado
- Impedir que preso, réu ou investigado tenha
seu advogado presente durante uma audiência e se comunique com ele
- Instaurar investigação de ação penal ou
administrativa sem indício (exceção: investigação preliminar sumária
devidamente justificada)
- Prestar informação falsa sobre investigação
para prejudicar o investigado
- Procrastinar investigação ou procedimento de
investigação
- Negar ao investigado acesso a documentos
relativos a etapas vencidas da investigação
- Exigir informação ou cumprimento de
obrigação formal sem amparo legal
- Usar cargo para se eximir de obrigação ou
obter vantagem
- Pedir vista de processo judicial para
retardar o seu andamento
- Atribuir culpa publicamente antes de formalizar
uma acusação
Vejamos
os Crimes punidos com detenção de um a quatro anos
- Decretar prisão fora das hipóteses legais
- Não relaxar prisão ilegal
- Não substituir prisão preventiva por outra
medida cautelar, quando couber
- Não conceder liberdade provisória, quando
couber
- Não deferir habeas corpus cabível
- Decretar a condução coercitiva sem intimação
prévia
- Constranger um preso a se exibir para a
curiosidade pública
- Constranger um preso a se submeter a
situação vexatória
- Constranger o preso a produzir provas contra
si ou contra outros
- Constranger a depor a pessoa que tem dever
funcional de sigilo
- Insistir em interrogatório de quem optou por
se manter calado
- Insistir em
interrogatório de quem exigiu a presença de um advogado, enquanto não houver
advogado presente
- Impedir ou retardar um pleito do preso à
autoridade judiciária
- Manter presos de diferentes sexos na mesma
cela
- Manter criança/adolescente em cela com
maiores de idade
- Entrar ou permanecer em imóvel sem
autorização judicial (exceções: flagrante e socorro)
- Coagir alguém a franquear acesso a um imóvel
- Cumprir mandado de busca e apreensão entre
21h e 5h
- Forjar flagrante
- Alterar cena de ocorrência
- Eximir-se de responsabilidade por excesso
cometido em investigação
- Constranger um hospital a admitir uma pessoa
já morta para alterar a hora ou o local do crime
- Obter prova por meio ilícito
- Usar prova mesmo tendo conhecimento de sua
ilicitude
- Divulgar material gravado que não tenha
relação com a investigação que o produziu, expondo a intimidade e/ou ferindo a
honra do investigado
- Inciar investigação contra pessoa
sabidamente inocente
- Bloquear bens além do necessário para pagar
dívidas
Chrystiano Angelo – Escritor – Autor
do Livro Audiência de Custódia e sua Aplicabilidade – Especialista Direito
Penal e Processo Penal
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