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Lei de lavagem viola princípio da não-culpabilidade

Posted by Chrystiano Angelo On terça-feira, 24 de julho de 2012 0 comentários

MANDAMENTO CONSTITUCIONAL

Lei de lavagem viola princípio da não-culpabilidade

Publicada em 10 de julho de 2012, a Lei 12.683/2012 alterou substancialmente a legislação que rege a lavagem de capitais (lei 9.613/1998) e segundo o legislador possui o escopo de tornar mais eficiente à persecução penal dos crimes de lavagem de dinheiro.
Referida legislação intitulada por alguns de “nova lei de combate à lavagem de dinheiro” trouxe várias alterações no que concerne aos aspectos substantivos e adjetivos da lei que, aliás, veio para tornar mais rigorosa a fiscalização e deveras gravosa a reprimenda para o delito de branqueamento de capitais.
Uma das principais inovações adveio com a revogação do rol taxativo dos crimes considerados graves e “antecedentes” da lei 9.613/1998 (tráfico, terrorismo, crimes contra a administração pública, extorsão mediante seqüestro, contrabando ou tráfico de armas, crimes de colarinho branco, praticados por organização criminosa). Ou seja, pelo texto da novel legislação, qualquer crime ou contravenção penal pode ser considerado como delito antecedente à lavagem de dinheiro (Artio 1º, da Lei 12.683/2012).
Em que pese esta recente mudança, nos parece que não agiu corretamente o legislador, criando uma verdadeira banalização da lei de lavagem, ao ampliar indiscriminadamente a figura dos intitulados “crimes antecedentes”.
Ao agir assim, o legislador deu o mesmo tratamento aos crimes considerados graves e aos delitos de menor potencial ofensivo, pois segundo a novel lei são tratados da mesma forma quem comete crimes considerados graves e dissimula a origem do capital considerado ilícito (ex: tráfico de drogas, extorsão mediante sequestro) e aqueles que cometeram contravenções (ex: explorar jogos de azar) ou crimes de menor potencial ofensivo (ex: transportar madeira sem guia florestal) e dissimulam a origem do dinheiro.
Ora, como se aplicar a mesma pena de lavagem (pena mínima de 3 anos) para quem efetuou branqueamento de capitais oriundos de intensa atividade de tráfico internacional de drogas (várias toneladas) e se aplicar a mesma reprimenda a quem apenas transportou alguns metros cúbicos de madeira (pequena quantidade) sem autorização legal? Seria crível se aplicar uma pena mínima de três anos para a lavagem decorrente do transporte ilegal de madeira, se a pena máxima para o transporte ilegal (delito originário) seria apenas 1(um) ano? Seria razoável aplicar a mesma pena se a lavagem do tráfico importou em alguns milhões de reais, e a do transporte ilegal de madeira em pouco mais de dez mil reais?
Como se vê, prevê o legislador idêntica punição para situações distintas e sem o mesmo grau de gravidade, o que além de ferir o princípio da proporcionalidade, revela-se um grande retrocesso.
No que tange a chamada colaboração premiada, referido instituto agora poderá ser concedido a ‘qualquer tempo’ (artigo 1º, parágrafo 5º, da Lei 12.683/2012). O que em outras palavras significa dizer que, com o advento da nova lei, o benefício da delação premiada poderá ser aplicado mesmo depois do édito condenatório, o que antes não era previsto na legislação.
Tal alteração, ao contrário da dos crimes antecedentes, é digna de aplausos.
Por fim, a pior alteração, em nossa singela opinião, recai no afastamento do servidor público de suas funções, em caso de indiciamento (artigo 17-D, da Lei 12.683/2012). Isto significa dizer que basta apenas o indiciamento pela autoridade policial para que o servidor público seja automaticamente afastado de suas funções.
Causa preocupação a desfaçatez com que se suprime direitos no nosso País.
Destarte, qualquer medida cautelar que restrinja direitos deve ser fundamentada por autoridade judiciária, sob pena de nulidade. É preocupante outorgar poderes ao Delegado de Polícia, com a devida vênia, para afastar um servidor do exercício de suas funções sem qualquer controle judicial, onde um simples indiciamento poderá gerar contornos irreparáveis.
Como medida cautelar, o afastamento apenas deverá ser determinado quando existirem elementos que demonstre que a permanência no cargo poderá gerar risco de continuidade delitiva, ou seja, para a efetividade do processo. No entanto, tal verificação e determinação será de competência exclusiva do órgão de controle judicial e jamais da autoridade policial.
Não se desconhece posicionamentos já externados no sentido de se aplicar o ‘afastamento preventivo’ previsto na Lei do servidor público (artigo 147 da Lei 8.112/1990) ao processo penal, sob fundamento de que na referida legislação o servidor poderá ser afastado preventivamente, sem decisão judicial, razão pela qual esta novel legislação apenas consignou este entendimento.
Todavia, com o devido respeito, não podemos olvidar, em primeiro lugar, que o indiciamento não se confunde com a formação de culpa que deverá ser analisada apenas pelo judiciário por parte do julgamento de mérito, sob pena de antecipação de pena.
E, em segundo lugar que, como medida cautelar, o afastamento apenas poderá ser determinado pelo judiciário se presentes os pressupostos necessários.
Logo, não se pode atribuir poderes ao delegado de polícia para afastar o servidor público de suas funções, sob pena de violação ao mandamento constitucional.
Com efeito, pode-se dizer que esta nova previsão legal, além de violar exaustivamente o princípio da não-culpabilidade, se mostra equivocada, haja vista que o afastamento apenas pode ser decretado pelo juiz, de forma fundamentada, como toda e qualquer decisão judicial.
Em arremate, entendemos que a lei trouxe avanços e retrocessos, e esses últimos precisam ser combatidos para que não tenhamos mais uma lei com contornos midiáticos a violar o sagrado devido processo legal, que possui com um dos seus substratos o princípio da razoabilidade.
Fonte: Conjur

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